Quando eu chego às nove da manhã no jornal e vou embora com o dia já escuro só consigo pensar em duas coisas: ainda no trabalho e no caminho apressado e esquisito, em cerveja. Quando chego na parada de ônibus e respiro, só quero me teletransportar pra debaixo do meu chuveiro quente e depois desmaiar.
Perdi o ônibus e enquanto reclamava comigo mesma, uma mulher que tava do meu lado me falou qualquer coisa. Eu só ri. Foi quando entendi que ela me perguntava se a loja de calçados atrás de nós fazia cartão de crédito. Disse que achava que não. ela começou a conversar. perguntou se eu tinha cartão, se meu nome já esteve sujo e que o dela esteve por 6 anos. A hora avançava e ela perdeu a aula.
- onde você estuda?
- eu não moro por aqui, moro na Roda de Fogo.
- ah, então você mora perto de mim. Moro no Engenho do Meio.
Quando o ônibus veio, tive a impressão dela ter dito que ia pegar o mesmo que eu e que ela era analfabeta - porque tinha me perguntado o nome da loja antes. Avisei e ela subiu logo atrás de mim.
Torci pra primeira cadeira depois da roleta estar vazia. Aquela que é só uma. Que você fica só, sem conversar, sem ninguém encostar em você. O único cara que subiu no ônibus antes de mim também queria ficar só e sentou nessa cadeira.
Sentei mais pra trás e ela do meu lado. Liguei pra minha mãe pra ver se minha vizinha de ônibus esquecia da nossa conversa. Eu queria dormir. Assim que desliguei, ela disse:
- tenho um celular desse com dois chips.
me contou todas as operadores de telefonia da casa dela. da filha, da neta. tirou o tênis que estava nos pés e cujas prestações ela só começará a pagar em novembro. pegou a havaiana nova, cheirou e colocou nos pés.
- que cheirinho de chiclete. tudo que é novo tem cheiro, né?
eu só ria e colocava o fone até ela falar de novo e eu tirar.
- vou descer no Engenho do Meio. vou entregar o cartão da minha amiga, da vereadora, ela é mulher do vereador.
- ela te emprestou o cartão, foi?
- foi. e ele tá levando todo mundo pra tirar título de graça.
- mas tirar título é de graça.
- não! tirar CERTIDÃO. certidão não é de graça, é R$50.
(eu, que nunca tirei uma certidão de nascimento, me calei...)
- mas ele não pode fazer isso, sabia?, continuei.
- não é ele. é ELA. ela tá AJUDANDO as pessoas.
eu entendi que não ia adiantar argumentar.
- quem é o marido dela?
ela me deu um santinho.
- ele é bonito, né? engraçadinho..
ri e disse que não achava.
- é sim, gordinho e ele tá rindo.
- mas todo político tira foto rindo.
ela concordou e me deu mais um santinho pra eu dar pra minha mãe.
perguntei o nome dela. depois de uns dois minutos, ela perguntou o meu. eu, com fone, só ri. ela repetiu:
- qual o seu nome?
- alana.
- prazer, alana, muito prazer em te conhecer. eu gosto de conversar com as pessoas, o caminho passa mais rápido, a gente fica menos preocupado.
eu ri.
encostei a cabeça na janela. eu só queria dormir. coloquei o fone. fechei os olhos. olhei pro lado discretamente e ela também tava com os olhos fechados, "dormindo". dormindo comigo, do meu lado.
bem na hora, Tulipa começou a gritar no meu ouvido, Criolo a gemer e saí dali por uns 4 minutos. chegou minha hora de descer, dei tchau.
- até outro dia.
- tchau, até.
confesso que fiquei decepcionada com a despedida até que ela disparou:
- meu telefone é...
abri o sorriso e respondi:
- certo.
não gravei o telefone e até o nome dela eu esqueci. A essa hora ela deve ter devolvido o cartão e está em casa mostrando a blusa nova que é a cara da neta. Amanhã quem vai pegar o cartão e estourar as contas é a filha de 18 anos. As primeiras faturas vencem em novembro e novembro já é amanhã, um pulo pro natal.
Só me lembro de que o nome dela começa com Val.
Que eu só queria dormir e que ela só queria conversar.
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Eu nunca tinha ouvido dor de amor no posto de gasolina
O primeiro nunca de hoje foi obrigatório. Tinha que estar no trabalho às 7h, acordei às 6h40. Me joguei embaixo do chuveiro, me molhei e voei. Peguei o carro. Nunca tinha ido trabalhar dia de semana de carro, mas foi o jeito de tentar não chegar tão atrasada.
Na volta, às 17h, o engarrafamento, um cansaço e a tristeza que foi começando a bater junto com a gasolina que estava prestes a acabar. Quando eu já me encaminhava para o fim do caminho, consegui encontrar um posto. Coloquei o combustível e desci pra pegar uma garrafinha de Smirnoff e um saco de Doritos. Na hora de pagar, o frentista:
- Beber e dirigir, não faça isso..
- Mas estou indo pra casa, vou beber lá.
- Ah, então tá.
(silêncio)
- Ó, eu estou brincando, viu?
- Eu sei!
- E ae, ganhou muitos presentes no dia dos namorados?
- HAHAHAHAHA, cheei de presente. Meu presente é esse aqui. (e levantei a comida e a bebida)
- Ah, então tá você e estou eu na mesma situação.. eu estou é choramingando.
- É? Por quê?
- Terminei meu namoro há 15 dias.
- Eita.... mas vai passar, poxa.
- Namoro de 6 anos...
- 6 anos??? É, vai demorar, mas vai passar.
Meu cartão foi aceito, ele me deu o recibo e fui embora.
- Tchau, boa sorte!
Eu nunca tinha ouvido desabafo de nenhum frentista e fui pra casa mais feliz pela minha cara, mesmo cansada, ter sido receptiva a ouvir um coração doído e, confesso, feliz pelo o meu não estar doendo e por lembrar que os frentistas, os pedreiros, os enfermeiros e os empresários, todo mundo, ama. E sofre. Mas ama.
Na volta, às 17h, o engarrafamento, um cansaço e a tristeza que foi começando a bater junto com a gasolina que estava prestes a acabar. Quando eu já me encaminhava para o fim do caminho, consegui encontrar um posto. Coloquei o combustível e desci pra pegar uma garrafinha de Smirnoff e um saco de Doritos. Na hora de pagar, o frentista:
- Beber e dirigir, não faça isso..
- Mas estou indo pra casa, vou beber lá.
- Ah, então tá.
(silêncio)
- Ó, eu estou brincando, viu?
- Eu sei!
- E ae, ganhou muitos presentes no dia dos namorados?
- HAHAHAHAHA, cheei de presente. Meu presente é esse aqui. (e levantei a comida e a bebida)
- Ah, então tá você e estou eu na mesma situação.. eu estou é choramingando.
- É? Por quê?
- Terminei meu namoro há 15 dias.
- Eita.... mas vai passar, poxa.
- Namoro de 6 anos...
- 6 anos??? É, vai demorar, mas vai passar.
Meu cartão foi aceito, ele me deu o recibo e fui embora.
- Tchau, boa sorte!
Eu nunca tinha ouvido desabafo de nenhum frentista e fui pra casa mais feliz pela minha cara, mesmo cansada, ter sido receptiva a ouvir um coração doído e, confesso, feliz pelo o meu não estar doendo e por lembrar que os frentistas, os pedreiros, os enfermeiros e os empresários, todo mundo, ama. E sofre. Mas ama.
segunda-feira, 11 de junho de 2012
Ônibus e filas, sempre. Mas eu nunca.
Acordei nesta segunda-feira com uma dessas decisões de segunda. Inspirada no blog 365 nuncas, resolvi escrever aqui tudo de novo que eu vá a fazer nos próximos dias. Não propositalmente, mas às vezes a gente vive coisas novas e nem se dá conta.
Comecei o dia já com um nunca. Quando fui passar no ônibus, descobri que tinha quebrado meu Vem Trabalhador. Sabe-se lá como. Só sei que foi na doideira da festa de sábado. Isso me obrigou à mais um nunca: ter que ir tirar a segunda via do cartão depois do trabalho.
Na fila, mais um: um menininho lindo, lindo, lindo que eu fiquei olhando, paquerando e ele morrendo de vergonha, se escondendo na mãe, desviando o olhar, olhando com o canto do olho. A gente cruzava uns olhares, ele desviava e me fez ficar pensando em gente grande, que olha, finge que não olha e a gente fica sempre sem entender. Acho que esse menininho vai ser um desses. Vai dar muita dor de cabeça pra muitas mulheres e/ou homens.
No fim da noite, o nunca de maior surpresa. Seis da noite, chuva, ônibus lotado e uma cadeira vazia do lado da minha e eu meio sonolenta. De repente, uma mulher que estava passando ainda pela roleta, joga a bolsa no assento vazio pra marcar lugar e impedir que o velhinho que se aproximava sentasse.
Comecei o dia já com um nunca. Quando fui passar no ônibus, descobri que tinha quebrado meu Vem Trabalhador. Sabe-se lá como. Só sei que foi na doideira da festa de sábado. Isso me obrigou à mais um nunca: ter que ir tirar a segunda via do cartão depois do trabalho.
Na fila, mais um: um menininho lindo, lindo, lindo que eu fiquei olhando, paquerando e ele morrendo de vergonha, se escondendo na mãe, desviando o olhar, olhando com o canto do olho. A gente cruzava uns olhares, ele desviava e me fez ficar pensando em gente grande, que olha, finge que não olha e a gente fica sempre sem entender. Acho que esse menininho vai ser um desses. Vai dar muita dor de cabeça pra muitas mulheres e/ou homens.
No fim da noite, o nunca de maior surpresa. Seis da noite, chuva, ônibus lotado e uma cadeira vazia do lado da minha e eu meio sonolenta. De repente, uma mulher que estava passando ainda pela roleta, joga a bolsa no assento vazio pra marcar lugar e impedir que o velhinho que se aproximava sentasse.
quarta-feira, 23 de maio de 2012
Da tristeza que meus olhos viram
Um dia eu vi um menino dos olhos tristes. A gente sabe que existe tristeza no mundo, mas ela nunca me tinha sido tão visível. O menino dos olhos tristes estava bem vestido, estudava e fazia teste pra uma dessas empresas que acredita vender felicidade. O menino dos olhos tristes não queria comprar felicidade, só queria um emprego. Eu, que nunca tinha visto tanta tristeza em dois olhos, torci para que ele conseguisse o emprego e ficasse mais feliz.
No dia anterior, eu havia ajudado uma menina flor no teste da loja de felicidade. A menina flor era amiga do meu amigo panda e simpatizei um pouco com ela por causa dessa amizade compartilhada. No dia que conheci o menino dos olhos tristes, me arrependi de ter ajudado a menina flor. Flor entrou para a loja e eu nunca vou saber se os olhos do menino triste algum dia ficaram mais felizes.
No dia anterior, eu havia ajudado uma menina flor no teste da loja de felicidade. A menina flor era amiga do meu amigo panda e simpatizei um pouco com ela por causa dessa amizade compartilhada. No dia que conheci o menino dos olhos tristes, me arrependi de ter ajudado a menina flor. Flor entrou para a loja e eu nunca vou saber se os olhos do menino triste algum dia ficaram mais felizes.
quarta-feira, 18 de abril de 2012
O dia que encontrei Sérgio Xavier no aeroporto e não me despedi do meu pai
Esses dias têm sido uma loucura. Entre choramingos e cervejas. Entre abandonos e corações soltos por aí. Entre quase nada no trabalho e um monte de coisa aos 45 minutos do segundo tempo.
A pauta importante que caiu na minha cabeça de repente e que eu precisava de vozes oficiais - aquela coisa que pode ser bem difícil de conseguir e você só tem uma chance. Liguei logo pra santa assessoria de imprensa que informou que o secretário amanhã estaria no Rio de Janeiro.
- A gente pode resolver hoje ainda?
- Pode, pode.
- Olha, agora eu posso falar com o secretário às 19h?
- Tudo bem.
Meu pai voltava pra Campo Grande hoje e, além de querer me despedir dele, precisava levá-lo até o aeroporto. Saí correndo do jornal, o ônibus demorou como sempre e, no caminho, a assessora me ligou de novo:
- Olha, o secretário vai te ligar, mas às sete horas ele já está no vôo.
- Vai me ligar agora?
- Daqui a pouco. Ele está indo pro aeroporto.
Eu ia ter que fazer uma entrevista no ônibus.
- Hum, por acaso eu também estou indo pro aeroporto agora, será que ele prefere que seja pessoalmente?
A assessora riu e disse que o secretário me ligaria e diria o que achava melhor.
Fiquei na dúvida se o melhor era que ele realmente me ligasse logo pra garantir a entrevista ou que o tempo passasse logo pra que eu chegasse em casa e fizesse a entrevista pelo menos por telefone, mas no carro, com mais calma e menos barulho.
Cheguei em casa, no aeroporto, e nada de ligação.
Meus pais foram logo pro embarque e fui estacionar. Assim que entrei no aeroporto, a primeira pessoa que vejo é Sérgio Xavier, sozinho, falando ao celular.
Me aproximei, parei ao lado e quando ele desligou, abordei:
- Secretário, estou esperando uma ligação sua.
Ele riu e disse que assim que desligasse o telefone, ia me ligar. Já que estávamos os dois ali, sentamos, conversamos com calma, gravei e ele embarcou.
Levantei tranquila e fui procurar meus pais. Meu irmão acenou e eu logo disse:
- Cadê o pai?
- Já entrou.
- Ham? Como assim? Sério?
Eu não acreditei e continuei andando em direção ao embarque até me dar conta que meu pai tinha mesmo ido e eu não tinha me despedido. Na verdade, ele ainda estava na sala de embarque e dei um tchau, com raiva, e chorosa.
Meu humor foi de novo do pico à fossa e vamos assim levando os próximos dias. Entre encontros e desencontros, chegadas e partidas, felicidades bobas e tristezas importantes.
A pauta importante que caiu na minha cabeça de repente e que eu precisava de vozes oficiais - aquela coisa que pode ser bem difícil de conseguir e você só tem uma chance. Liguei logo pra santa assessoria de imprensa que informou que o secretário amanhã estaria no Rio de Janeiro.
- A gente pode resolver hoje ainda?
- Pode, pode.
- Olha, agora eu posso falar com o secretário às 19h?
- Tudo bem.
Meu pai voltava pra Campo Grande hoje e, além de querer me despedir dele, precisava levá-lo até o aeroporto. Saí correndo do jornal, o ônibus demorou como sempre e, no caminho, a assessora me ligou de novo:
- Olha, o secretário vai te ligar, mas às sete horas ele já está no vôo.
- Vai me ligar agora?
- Daqui a pouco. Ele está indo pro aeroporto.
Eu ia ter que fazer uma entrevista no ônibus.
- Hum, por acaso eu também estou indo pro aeroporto agora, será que ele prefere que seja pessoalmente?
A assessora riu e disse que o secretário me ligaria e diria o que achava melhor.
Fiquei na dúvida se o melhor era que ele realmente me ligasse logo pra garantir a entrevista ou que o tempo passasse logo pra que eu chegasse em casa e fizesse a entrevista pelo menos por telefone, mas no carro, com mais calma e menos barulho.
Cheguei em casa, no aeroporto, e nada de ligação.
Meus pais foram logo pro embarque e fui estacionar. Assim que entrei no aeroporto, a primeira pessoa que vejo é Sérgio Xavier, sozinho, falando ao celular.
Me aproximei, parei ao lado e quando ele desligou, abordei:
- Secretário, estou esperando uma ligação sua.
Ele riu e disse que assim que desligasse o telefone, ia me ligar. Já que estávamos os dois ali, sentamos, conversamos com calma, gravei e ele embarcou.
Levantei tranquila e fui procurar meus pais. Meu irmão acenou e eu logo disse:
- Cadê o pai?
- Já entrou.
- Ham? Como assim? Sério?
Eu não acreditei e continuei andando em direção ao embarque até me dar conta que meu pai tinha mesmo ido e eu não tinha me despedido. Na verdade, ele ainda estava na sala de embarque e dei um tchau, com raiva, e chorosa.
Meu humor foi de novo do pico à fossa e vamos assim levando os próximos dias. Entre encontros e desencontros, chegadas e partidas, felicidades bobas e tristezas importantes.
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